domingo, 18 de fevereiro de 2018

O que distância o Anarquismo da Esquerda

Não irei pela base etiológica e nem pela essência que ela constitui

e sim pelo que queremos, observamos e teorizamos!

 

 

Uma das principais base do Anarquismo é a revolução social, sem isso, sem esse preceito – o anarquismo deixaria de ser anarquista diante os sistemas de opressão, autoridade e hierarquia. O anarquista sabe das dificuldades que à de surgir em uma revolução, sabe do processo devido as consequências diretas em mexer com as estruturas sociais que estão estabelecidas e protegidas com direito divino.
Assim sabe que em todo momento, uma minoria oportunista vai tentar restaurar a mesma ordem governamental e hierárquica que é e será o principal motivo de revoluções, porém, sabe que não será intitulado no momento como “Estado” ou “Democracia Representativa” e sim como“Governo provisório”; “Assembleia Popular”; “Administradores do Proletariado”; – ou qualquer coisa que faça as massas “se envolver”; irão falar como será dificultoso e complexo todos administrarem a coisa pública, pois enquanto o povo dão continuidade a revolução os politiqueiros cuidam e distribuem para as massas o que é relativo a coisa pública.
É sempre com o mesmo slogan: “do povo que luta e o governo que ajuda” por onde a autoridade se instaura. Todos os partidários do governo e da autoridade se estabelecem sobre o signo de que é necessário um “governo provisório” ou qualquer nome que se dê diante a forma deplorável de conservar uma das estruturas societárias atual.
Nos dizem: “Beleza! Se não querem um governo, como irão mudar a sociedade e lutar contra a burguesia internacional?”
Sabemos muito bem que em uma revolução não existe mar-de-rosas e muito menos é autoritária, como os sofistas partidários da reação e conservadorismo dogmatizarão para as massas; – é sim um processo amplo e composto pelas insurgências simples é a composição do simples que explodirá em uma revolução social, de antemão à isso, as lutas que são efeitos direto da revolta popular que enforcam um ministro aqui ou uma bomba explode em um encontro da alta-classe lá; é apenas a junção da raiva, ódio e violência acumulada durante décadas ou séculos pela classe oprimida transformada em ação revolucionária, ou seja, a violência divulgada pelas corporações midiáticas ocasionando uma histeria coletiva na classe-média e ou esquerda puritana, nada mais é do que um conjunto de organizações especificas ou indivíduos autônomos do simples ao composto que estão tentando eliminar o “ancien régime” com toda força, responsabilidade e capacidade disponível naquele instante, esse momento de destruição-criação não é possível existir governo, autoridade ou líder constituído dado que é apenas a expressão libertadora e revolucionária das massas.
São as massas e só elas que têm essa força emancipadora e libertária e somente ocorre isso nas ruas!
Enquanto isso a esquerda e os partidários da autoridade tentam influenciar as massas a aderirem a um “governo popular e provisório”, para garantir a permanência organizada e contábil de uma revolução, a esquerda quer revolucionar dentro da câmara municipal, como bem explica Piotr Kropotkin:
Os socialistas governamentais, os radicais, os gênios ignorantes do jornalismo, os oradores de efeito burgueses, ex-trabalhadores, correrão à casa municipal e aos ministérios tomar posse dos lugares abandonados, tomarão galões de coração alegre, admirar-se-ão nos espelhos ministeriais, ensaiarão para dar ordens com um ar de gravidade à altura das circunstâncias. Precisam de um cinto vermelho, um guepe agaloado e um gesto magistral para se imporem ao ex-camarada de redação ou de ateliê. Os outros enterrar-se-ão na papelada com a melhor vontade de perceberem alguma coisa. Redigirão leis, lançarão decretos com palavras bombásticas, que ninguém pensará em executar, justamente por estar em revolução.
Tomarão os nomes de Governo Provisório, de Comitê de Salvação Pública, de Administrador, de Comandante da Municipalidade, de Chefe de Segurança ou o que for. Eleitos ou aclamados, reunir-se-ão em Parlamento ou em Conselhos da Comuna. Ali encontrar-se-ão homens pertencentes a 10, a 20 escolas diferentes, que não são “capelas” pessoais, como se diz muitas vezes, mas que correspondem a maneiras particulares de conceber a extensão, o alcance e o dever da revolução. Partidários de todos os matizes, gente honesta confundindo-se com os ambiciosos: todos apresentando-se com ideias diametralmente opostas, fazendo alianças fictícias para constituir maiorias, disputando, tratando-se de reacionários, de autoridades, de patifes, discutindo asneiras, não publicando senão proclamações pomposas; tomando-se todos a sério, enquanto a verdadeira força do movimento está na RUA.
Tudo isto pode divertir os aficionados do teatro. Mas ainda não é a revolução. Nada esta feito.”1
Como citado, a crença e a fé pela necessidade de um governo e autoridade não tem uma dicotomia, ela é a base da mesma; – O anarquismo é o anti-governo, a esquerda procura um, o anarquismo é a noção de retorno de consciência do indivíduo e responsabilidade individual em organizações coletivas especificas, a esquerda é a negação disso em detrimento de uma minoria “intelectual” governando a maioria ignorante, assim tanto pelo que queremos como pelo que pretendemos, não temos nenhuma similaridade com a esquerda.
É o povo com a força motriz da destruição-criação que irá revolucionar os pilares da sociedade e economia, é o povo nas ruas e não nas câmaras que terá chances concretas de se proteger de ameaças externas, no momento que um governo provisório se instalar (ou qualquer nome que se de as tentativas de dirigir hierarquicamente uma revolução) será o fim da revolução, estabilizando assim a contrarrevolução, o povo armado, controlando e administrando a coisa pública, expropriando a burguesia, ocupando e autogerindo as fábricas e indústrias, organizando a produção de forma comunista é que terá força e materialidade concreta de vitória!
Entendemos que a esquerda estará em uma sala trancada tentando dirigir e influenciar a revolução (claro, junto aos reacionários e conservadores que se intitulariam eles mesmo de esquerda), enquanto nós, anarquistas estaremos com o povo nas ruas, organizando assembleias orgânicas direta para tática e luta, aqueles que insistem em se intitular “anarquista” mas que dão suporte e aporte a essas tendências governamentais de esquerda, estão muito longe de serem considerados anarquista, seriamente nem se pode ser considerado um. Longe de generalizar a “esquerda”, muitos dessa ala tem vontades honestas, mas estão impregnados fortemente na necessidade de governo e autoridade, que no fim, acabam cedendo ao que o “partido ou dirigente quer” e nunca a verdadeira aspiração do povo nas ruas, afirmamos que dialeticamente o anarquismo é anti-esquerda e anti-direita diretamente pela concepção etiológica e teleológica.
E ainda sim, os reformistas e governistas gritam: “Queremos a mesma coisa que vocês, só temos métodos e táticas diferentes.”
Não temos apenas o método, à tática, mas também a concepção, visão e constatação contrárias; – o que de fato pode nos aproximar da esquerda é apenas uma questão de luta social, pois é esse a aproximação máxima que nós temos em comum com vocês, onde concebemos que a inserção das massas nas lutas sociais aumenta a condição experimental para uma possível revolução à que almejamos, mas que, não é suficiente; lutar pela diminuição da carga de trabalho, mais direitos trabalhistas ou qualquer coisa que no momento aumente um pouco o bem-estar do trabalhador ou trabalhadora é apenas uma forma de conformismo classista, onde a esperança proletária fica depositada na “benevolência” dos partidos políticos que longe de estarem de acordo com a classe operária, são antagônicos a mesma! A própria existência da classe trabalhadora já é uma forma de luta e ativismo per si. O que a esquerda quer, se não apenas divulgar o mito da diminuição da diminuição da desigualdade social, distribuição das riquezas sociais, taxação de grandes fortunas e outros ensaios teatrais presente no “mise en scène” da política.
A negação direta da própria representatividade onde eles dizem com paixão que representam a classe oprimida e luta pela igualdade e liberdade, mas, esquecem que a representatividade tem dois polos (ou fingem esquecer) que além de uma mentira é ilógico achar que poucos indivíduos sentados em cadeira de couro na casa pública são capazes de representar milhares ou milhões de pessoas, antes mesmo de representar seus próprios interesses, depois o interesse do partido que está ligado e por ultimo e não menos importante, representar os interesses dos patrocinadores da campanha eleitoral (banqueiros, corporações, empresas, mídia, etc…), existe uma gama de preceitos e fatos que destrói a noção de governo e democracia – e tudo isso a esquerda ignora e em conjunto com a direita cantam em coro a necessidade de autoridade, governo e chefes com uma propaganda enganosa conduzem as massas a isso.
Dizem “o governo de direita acabou com a economia e a política”e então a direita retruca “Não! Foi o governo de esquerda que acabou com a economia e a política”, assim com essa retórica sofista dançam com as massas em um ritmo totalmente contrário a própria. Assim é se dado o complô dialeticamente destrutivo entre anarquismo e a esquerda; – sabemos que a própria política é a culpada e antagônica a economia e sociedade em um todo, é um mito poético espalhado pela academia e mídias que governos são “administradores necessários”, mas que no concreto se demonstra inútil e totalmente contrário as aspirações reais da sociedade, podemos repetir os escritos dos anarquistas clássicos demonstrando toda a inconsistência da administração política sobre a égide de um Estado, governo e autoridades, como demonstrar a mesma retórica na economia sobre patrões e trabalhado assalariado, mas, ainda sim, a crença e a fé na mitologia são mais fortes que a realidade e verdade material concreta.
Longe do anarquismo ser isento como os sofistas partidários e desonestos tentam expressar para criar uma falsa alusão de que“não sabe e não tem nem base do que está falando” , o anarquismo é um sistema político anti-político como dizia Bakunin, isso é, luta pelo fim do Estado no mesmo instante que coloca uma nova formação sócio-política no lugar, por isso a dialética da destruição-criação presente em Bakunin estipula com maestria e lógica a negação de toda e qualquer forma de política institucional e ou partidária; podemos identificar isso com Kropotkin:

Em seus começos, a anarquia apresentou-se como uma simples negação. Negação do Estado e da acumulação pessoal do capital. Negação de toda espécie de autoridade. Negação ainda das formas estabelecidas da sociedade, embasadas na injustiça, no egoísmo absurdo e na opressão, bem como da moral corrente, derivada do Código Romano, adotado e santificado pela Igreja cristã.
[…] “Nada de Estado” ou “nada de autoridade”, malgrado sua forma negativa, tinha um profundo sentindo afirmativo em suas bocas. Era um principio filosófico e prático, significando ao mesmo tempo que todo o conjunto da vida das sociedades, tudo – desde as relações cotidianas entre indivíduos até as grandes relações de raças para além dos oceanos – podia e devia ser reformado, e o seria necessariamente, cedo ou tarde, segundo os princípios da anarquia: a liberdade plena e completa do indivíduo, os grupamentos naturais e temporários, a solidariedade, passada ao estado de hábito social.” 2
Como percebido, não é questão de ser isento, porque o anarquismo não é uma forma ideológica de conceber a política, sociedade e economia, mas sim uma doutrina filosófica, teórica e prática de ação, luta e movimento; não fazendo parte do espectro político partidário e institucional hoje, não somos isentos, e sim ativos diretamente contra toda forma de partidarismo, institucionalismo e isenção presente nas sociedades irracionalistas liberais e pós-modernas que infecta qualquer racionalidade e pensamento revolucionário.
Quando falamos que o anarquismo é uma doutrina, não estamos criando um dogma sobre, e sim demonstrando que é apenas um conjunto de princípios que formam a base filosófica, científica, social, econômica do anarquismo, não está preso a esse ou essa ideologia, mas sim, tem sua própria formação e prática, indiferente as outras escolas socialistas. Uma das principais confusões que tentam a todo custo encaixar o anarquismo como de esquerda, é a noção que pelo anarquismo ser um tipo de socialismo, ele é de esquerda 
a fortiori(com razão mais convincente; com muito mais motivo; com mais forte razão) mas isso é um erro crasso e simplório, como explica Malatesta:

Para alcançar o socialismo e consolidá-lo, é preciso necessariamente, portanto, um meio que não possa ser, ele também, uma fonte de exploração e dominação, e que conduza a uma organização capaz de corresponder o máximo possível aos interesses e às preferências, variadas e mutáveis, dos diversos indivíduos e grupos humanos.
Tal meio não pode ser a ditadura (monarquia, cesarismo, etc.) visto que ela substitui a vontade e a inteligência de todos pela vontade e pela inteligência de um único indivíduo ou de alguns indivíduos. Tende a impor a necessidade de uma força armada para coagir os recalcitrantes à obediência; faz surgir os interesses antagônicos entre a massa e aqueles que estão próximos do poder, e resulta no triunfo da revolta ou na consolidação de uma classe de governantes que, evidentemente, torna-se também uma classe de proprietários. Oparlamentarismo (democracia, república) também não aparece como um meio válido, levando em conta que também substitui à vontade de todos a vontade de alguns indivíduos; se de um lado, deixa um pouco mais de liberdade do que a ditadura, por outro lado, as ilusões que ele cria são maiores; e, em nome de um interesse coletivo puramente fictício, pisoteia todos os interesses reais e vai de encontro à vontade de cada um, assim como à vontade de todos, através das eleições e dos votos. “3
Assim vemos que a anarquia e o socialismo está ligado, mas não pelo parlamentarismo ou ditadura, nem reformismo ou qualquer outra semântica esquerdista, e sim:

“Para nós, portanto, socialismo e anarquia são termos que não são nem opostos nem equivalentes, mas estreitamente ligados um ao outro, como o é o fim ao meio que lhe corresponde necessariamente; como o é o fundo à forma na qual ele encarna-se.
O socialismo sem a anarquia, ou seja, o socialismo de Estado, parece-nos impossível, pois seria destruído por este mesmo órgão que deveria mantê-lo: o Estado.
A anarquia sem o socialismo parece-nos igualmente impossível, pois ela só poderia ser, neste caso, a dominação dos mais fortes e resultaria rapidamente, por consequência, na organização e na consolidação desta dominação – ou seja, no estabelecimento de um governo.4
Podemos perceber que, temos o socialismo como preceito filosófico básico que nos assemelha as outras escolas socialistas, mas que longe de sermos parte dessas escolas, somos totalmente antagônicos a elas, assim, vemos que toda forma de emancipação operária, campesina ou humana em termos gerais, só se dá pela anarquia, o que temos em comum é o único consenso de socialização dos meios de produção e igualdade social e econômica, fora isso, temos o começo, o meio e o fim totalmente contrário a qualquer outra escola socialista.
Poderão insistir ainda que fazemos parte desse espectro político, dado que não importa o quão didático e lógico você consiga ser perante a um crente e irracionalista, ele sempre tentará de uma forma ou outra vencer o debate e você acaba jogando pérolas aos porcos, como diz o ditado popular, podemos ser de esquerda, se e somente se, todo o os partidos políticos, táticas e organizações que tem líderes, chefes e governos forem considerados de direita, ou seja, se toda a conotação política do espectro político passe-a ser considerado como de direita e o anarquismo o único de esquerda, os partidários ficariam furiosos não? Irão dar chiliques e tudo, mas não enxergam que o espectro político direita/esquerda/centro é apenas uma simplicidade sofista diante a complexidade política de dominação, autoritarismo e submissão, temos que entender que até mesmo em vários locais o anarquismo “é considerado mais à esquerda do próprio marxismo”como diria Lênin perante a revolução Russa; mas isso é apenas simplicidade e sofisma.
Pelas bases do anarquismo, a destruição dos pilares que se está sustentado toda a política, sociedade e economia hoje e a criação de uma sociedade libertária, com uma nova forma de política, sociedade e economia, fica nítido que tanto na proposta futura, na base sólida e na luta presente, o anarquismo é antagônico a qualquer forma de preceitos dogmáticos e pueris como direita/esquerda/centro assim, não há espaço para um anarquismo marxista, anarquismo cristão, anarquismo mercantil, anarquismos e mais anarquismos, suas bases são delineadas, suas propostas difere em alguns pontos, mas que em nenhum momento se propôs a aceitar e acatar inserção autoritária, religiosa ou dogmática dentro da teoria, é impossível isso; a noção de “cagação de regras” se dá por mentes reformistas e alienadas, e não pelos anarquistas, longe de sermos libertinosos, desordeiros e preguiçosos, somos críticos, libertários e ordeiros, não temos e não iremos aceitar que qualquer coisa que “negue o Estado” ou “negue a Autoridade” se intitule de anarquista, por simplesmente ter aprendido isso em blogs ou vídeos da internet.

Conclusão:
O anarquismo não faz parte da esquerda e muito menos de uma extrema-esquerda, é socialista e anticapitalista, nega qualquer inserção dogmática, religiosa ou de fundo religioso dentro do movimento, está estreitamente ligado com a ideia-forte do socialismo, não sendo um socialismo per si, mas tendo como base pura.
Assim, todo(a) aquele que diz que o anarquismo é de esquerda, é antes de tudo, de esquerda e não anarquista; aqueles que ainda tentam criar sofismas e alterações nos escritos do clássico são deliberadamente esquerdista reformista manipulando toda a história anarquista! Anarquista que se intitula de esquerda, é apenas um marxista com medo de se assumir como tal.
1.A conquista do Pão – PG; 29 – Piotr Kropotkin
2.O Princípio Anarquista e outros ensaios; PG; 35-36 – Piotr Kropotkin
3.Anarquistas, Socialistas e Comunistas; PG; 49 – Errico Malatesta
4.Ibidem. Pg;50